CARACTERÍSTICAS MUSICAIS DO BLUES
2.1 A forma
Há no Blues algo que não pode ser notado, algo que é próprio da execução ao vivo. Pode-se até escrevê-lo em partituras e/ou cifras, mas sua execução vai além do papel. Ele não pode ser rotulado. Não pode ser capturado. Sua essência está no próprio momento em que é executado.
Essa forma em que é concebido se deve, em grande parte, por ser o Blues um gênero musical criado por músicos que não sabiam ler música. Os primeiros bluesman não utilizavam a partitura para aprender e/ou conceber suas canções. Elas eram aprendidas e concebidas “de ouvido”. Sendo assim, um dos fatores essenciais no Blues, e nos demais estilos musicais derivados da cultura afro-americana, é a improvisação. Nesse sentido, o termo Jam session é muito utilizado pelos músicos de Blues, representando uma forma “descompromissada” e “descontraída” de tocar utilizando a improvisação e a liberdade de criação. Oliver (1997) observa que “Como o Blues foi criado mormente por músicos iletrados, raramente algum dos quais lia música, ele é, função disso, primariamente, música de ouvido (OLIVER, 1997, p. 42).
O Blues apresenta, sim, uma estrutura, e uma de suas principais formas é a chamada “Blues de doze compassos”. Para o bluesman, conhecer a forma é o que o possibilita transitar livremente pela improvisação. Barry Ulanov, em seu livro A história do jazz, define a estrutura do Blues da seguinte maneira:
A forma básica do Blues consiste em um chorus de doze compassos, na qual uma exposição inicial de quatro compassos é repetida nos segundos quatro, com uma ligeira mudança harmônica e melódica, e depois, outra vez, mas com variações mais acentuadas, nos quatro últimos compasso (ULANOV, 1957, p. 33)
2.2 A harmonia
Chase (1957) também menciona que: “A estrutura habitual dos Blues consta de doze compassos. Cada verso corresponde a quatro compassos da música...” (CHASE, 1957, p. 414). Essa forma costuma ser classificada como Slow Changes ou Fast Changes. Tal classificação é utilizada baseando-se no andamento da canção, mas, principalmente, na movimentação da harmonia. Sendo assim, em Fast Change a movimentação harmônica se dá de forma rápida. Um bom exemplo de canção que utiliza esta estrutura principal do Blues é Sweet Home Chicago, de Robert Johnson. Tendo esta canção como base, a estrutura de doze compassos do Blues fica assim representada, no tom de Mi Blues: [11]
Sweet Home Chicago - Robert Johnson Fast change
E7 | A7 | E7 | % | A7 | % | E7 | % | B7 | A7 | E7 | B7
Outra canção que se enquadra nesta classificação Fast change é Texas Flood, de Stevie Ray Vaughan. No tom de Fá Blues, ela fica assim representada:
Texas Flood - Stevie Ray Vaughan Fast change
F7 | Bb7 | F7 | % | Bb7 | % | F7 | % | C7 | Bb7 | F7 | C7
Já em Slow change, a movimentação harmônica dentro do Blues se dá de forma lenta, mas
mantêm-se a estrutura de doze compassos. A canção Goin´to Chicago, de T-Bone Walker, é um ótimo exemplo desta padronização. No tom de Sol Blues ela fica assim representada:
Goin' to Chicago - Slow change
G7 | % | % | % | C7 | % | G7 | % | D7 | C7 | G7 | D7
Observando-se a padronização da estrutura em doze compassos do Blues, e, sobretudo, analisando e tocando as canções, percebe-se que a harmonia é utilizada de forma bem simples neste gênero musical. Chase (1957) afirma que “... no que diz respeito à harmonia: o esquema harmônico do Blues nada mais é do que um alicerce sobre o qual repousa a estrutura melódica” (CHASE, 1957, p. 413). Sendo assim, em sua estrutura tradicional de doze compassos, o Blues utiliza apenas três acordes. Conforme observa Ottaviano (2011), “Os acordes no Blues são normalmente baseados na cadência harmônica I(tônica), IV(subdominante) e V (dominante)...” (OTTAVIANO, 2011, p. 20). Dentro desta estrutura, em Slow Change, os quatro primeiros compassos estão sobre o acorde da tônica, o 5º e o 6º sobre a subdominante, voltando para a tônica nos sétimo e oitavo compassos. No 9º compasso aparece o acorde da dominante, voltando para a subdominante no décimo. O 11º compasso utiliza o acorde da tônica seguindo para a dominante no 12º, que, auditivamente, nos passa a sensação de retorno ao início da estrutura.
Já em Fast change, a estrutura padrão do Blues fica assim definida: 1º compasso no acorde da tônica, 2º no da subdominante seguidos do 3º e 4º compassos retornando para o acorde da tônica. 5º e 6º compassos sobre o acorde da subdominante e 7º e 8º novamente na tônica. No 9º compasso aparece o acorde da dominante e no 10º o da subdominante. No 11º compasso reaparece o acorde da tônica seguindo para o da dominante no 12º que, assim como em Slow change, nos passa a sensação de retorno ao início da estrutura.
Na linguagem idiomática do Blues, se diz “tocar um chorus” toda vez que esta estrutura é executada. Sendo assim, executar um chorus consiste a cada giro inteiro desta forma. Geralmente executa-se dois chorus completos para cada seção de improviso ou tema da canção. Há muitas variações sobre esta forma, mas esta é tão conhecida que, “tocar Blues”, geralmente se associa com a sua utilização.
Outro fator interessante sobre a harmonia do Blues é que esta utiliza, basicamente, acordes maiores com 7º menor (x7). Sendo assim, associando-se com a melodia da canção, reside um dos segredos do Blues, o que nos leva a reconhecer sua sonoridade já no início de sua execução: acordes maiores com melodias associadas a menores. Para uma melhor abordagem dessa particularidade do estilo, precisamos adentrar em sua estrutura melódica.
[11] O Blues tem uma particularidade em se tratando da tonalidade. Costuma-se classificar o tom da canção utilizando a terminologia “Blues” após a nota. Como por exemplo: Lá Blues; Dó Blues,etc.
...
Nenhum comentário